(1783) MOZART Missa n. 18 "Grande"

Große Messe (Missa Grande)

Compositor: Wolfgang Amadeus Mozart
Número de catálogo: K 427 / K-6 417a
Data da composição: de julho/agosto de 1782 até maio de 1783
Estréia: 26 de outubro de 1783 — Abadia de São Pedro, Salzburg — Constanze Weber Mozart cantando o solo de soprano, com o coro da Abadia, músicos da Orquestra da Corte do Arcebispado (Hofmusikkapelle) sob a direção de Mozart 

Mozart já havia, desde menino, escrito muitas missas: eram 10 Missas breves e mais 7 Solenes (de maior duração), sendo que a primeira ele criou em Salzburg em 1768 com 12 anos! Todas são inventivas, brilhantes, tem raiz direta no canto italianizado da ópera, e algumas — como a Missa "da Coroação" ou a "do Orfanato" — se destacam pela extrema beleza das frases musicais. Mas nenhuma outra chegou perto da majestade desta, sua última Missa antes do Réquiem.

A "Grande Missa" começou a ser escrita no verão de 1782 e nunca foi propriamente terminada. Faltam partes do "Credo" e do "Agnus Dei"; e o "Sanctus" teve todo uma parte da partitura perdida e o que se escuta hoje é uma re-edição do trecho. Na primeira execução em Salzburg, em 1783, a música — funcional, como a praxe da época — foi inserida no rito religioso e é provável que Mozart tenha lançado mão de partes de suas Missas mais antigas (todas compostas lá mesmo em Salzburg) para cobrir os trechos que ele não tinha composto, e que jamais comporia!

A obra é contemporânea de um período de muitas mudanças na vida do jovem compositor, à época com 26 anos. Mozart havia recém abandonado (maio de 1781) o serviço de compositor da corte do Arcebispo de Salzburg e estava estabelecido em Viena como músico independente. Em 31 de julho de 1782 ele escreve ao pai pedindo permissão para casar-se com Constanze, irmã de Aloysia Weber (por quem ele já havia sido apaixonado, dando inúmeras dores-de-cabeça ao pai). Certo de que o pai jamais aprovaria sua união com uma Weber, casou dia 4 de agosto sem esperar pela permissão pedida, deixando o pai de cabelos em pé. Leopold, que já via com extrema preocupação a situação do filho sem um vínculo de trabalho — coisa impensável na época — na frívola capital do Império, agora dobrava seu temor diante da impulsividade com que Wolfgang decidia as coisas. Ficaram um bom tempo sem se falar.

A Missa surge nessa atmosfera de idílio e excitação. Como não se sabe ao certo se ela teve origem em alguma encomenda — e é provável que não tenha sido esse o caso —, podemos supor que Mozart estava mesmo motivado pelo próprio casamento, com o qual a data coincide com os primeiros esboços. Mozart vinha estudando na famosa biblioteca de partituras do Barão Van Swieten e teve acesso a muitas partituras barrocas, impressionando-se especialmente com obras de Bach e Händel, e ecos deste último se podem perceber em várias passagens, sobretudo nas fugas e nos corais divididos em 8 partes.

A visita a Salzburg em 1783, durante a qual a Missa foi tocada, foi a primeira de Mozart desde o casamento, e uma espécie de reconciliação dele com o pai. Constanze, que era cantora de boa voz, executou o solo principal no "Et incarnatus", página de grande inspiração. A obra requer uma orquestra bem mais consistente que as Missas anteriores do autor, um coro completo e 4 solistas, sendo duas sopranos, um tenor e um baixo.

KYRIE
I. Kyrie: Andante moderato 
(Kyrie: A passo de caminhada, moderadamente)
   
Coro, Soprano I:
Kyrie eleison          Senhor, tende piedade
Christie eleison          Cristo, tende piedade

GLORIA
II. Gloria: Allegro vivace
(Gloria: Rápido e vivo)

Coro:
Gloria in excelsis Deo          Glória a Deus nas alturas
et in terra pax hominibus bonae voluntatis          e paz na terra aos homens por Ele amados
 
III. Laudamos Te: Allegro aperto
(Laudamos: Rápido, livremente)

Soprano II:
Laudamus te          nós Vos louvamos
benedicimus te          nós Vos bendizemos
adoramus te          nós Vos adoramos
glorificamus te          nós Vos glorificamos

IV. Gratias: Adagio
(Gratias: Lento)

Coro:
Gratias agimus tibi          nós Vos damos graças
propter magnam gloriam tuam          por vossa imensa glória

V. Domine: Allegro moderato
(Domine: Rápido, moderadamente)

Soprano I, Soprano II:
Domine Deus, Rex cælestis          Senhor Deus, Rei Celeste
Deus Pater omnipotens          Deus Pai Onipotente
Domine Fili unigenite Jesu Christe          Senhor Jesus Cristo, Filho Unigénito
Domine Deus, Agnus Dei, Filius Patris          Senhor Deus, Cordeiro de Deus, Filho de Deus Pai

VI. Qui tollis: Largo
(Qui tollis: Muito lento)

Coro duplo:
Qui tollis peccata mundi          Vós que tirais o pecado do mundo
miserere nobis          tende piedade de nós
Qui tollis peccata mundi           Vós que tirais o pecado do mundo
suscipe deprecationem nostram           acolhei a nossa súplica
Qui sedes ad dexteram Patris          Vós que estais à direita do Pai
miserere nobis          tende piedade de nós

VII. Quoniam: Allegro
(Quoniam: Rápido)

Soprano I, Soprano II, Tenor:
Quoniam tu solus sanctus           Só Vós sois o Santo
tu solus Dominus           só Vós, o Senhor
tu solus altissimus            só Vós, o Altíssimo
 
VIII. Jesu: Adagio
(Jesu: Lento)

Coro:
Jesus Christe          Jesus Cristo
cum sancto Spiritu, in gloria Dei Patris           com o Espírito Santo na glória de Deus Pai
Amen            Amém

CREDO
IX. Credo: Allegro maestoso
(Credo: Rápido e majestosamente)

Coro:
Credo in unum Deum           Creio em um só Deus
Patrem omnipotentem          Pai Todo-Poderoso
Factorem cæli et terræ          Criador dos céus e da terra
visibilium omnium et invisibilium          De tudo o que é visível e invisível
Et in unum Dominum, Iesum Christum          E no Senhor Jesus Cristo
Filium Dei unigenitum          Filho Unigênito de Deus
Et ex Patre natum, ante omnia sæcula          E nascido do Pai antes de todos os séculos
Deum de Deo, lumen de lumine          Deus de Deus, Luz da Luz
Deum verum de Deo vero          Deus verdadeiro do Deus verdadeiro
Genitum, non Factum, consubstatialem Patri          Foi gerado e não criado, consubstancial ao Pai
Per quem omnia facta sunt           Por quem tudo foi feito
Qui propter nos homines            E que, por nós, homens
Et propter nostram salutem           Para nossa salvação
Descendit de cælis           Desceu dos céus
   
X. Et incarnatus: Andante
(Et incarnatus: A passo de caminhada)

Soprano I:
Et incarnatus est de Spiritu Sancto           E encarnou pelo poder do Espírito Santo
Ex Maria Virgine: et homo factus est            Nascendo da Virgem Maria: e fez-se homem
 
[A partir daqui, Mozart não colocou música para o restante do CREDO]
 
SANCTUS
XI. Sanctus: Largo
(Sanctus: Muito lento)

Coro duplo:
Sanctus, Sanctus, Sanctus          Santo, Santo, Santo
Dominus, Deus Sabaoth          Senhor Deus dos Exércitos
Pleni sunt cæli et terra gloria tua          O Céu e a Terra estão cheios da Vossa glória
Hosanna, in excelsis           Hosana nas alturas

BENEDICTUS
XII. Benedictus: Allegro comodo
(Benedictus: Rápido, confortavelmente)

Todos:
Benedictus qui venit          Bendito é aquele que vem
In nomine Domini          Em nome do Senhor
Hosanna in excelsis          Hosana nas alturas


A música que Mozart deixou termina aqui, não havendo partitura para o texto do "Agnus Dei" (Cordeiro de Deus). Em alguns casos, o maestro opta por usar a música do Kyrie inicial para o texto do Agnus Dei no final, mas nem sempre isso acontece. Em 1785 Mozart iria re-aproveitar a obra, colocando um texto de Saverio Mattei no lugar do Kyrie e do Gloria, para atender a uma encomenda da Sociedade dos Compositores de Viena, criando assim a Cantata "Davi Penitente" que estreou no Burgtheater. Então, se você ouvir a mesma música com outro texto, não estranhe!
 
© RAFAEL FONSECA